sexta-feira, 3 de abril de 2009

Leituras

1. "O que é ao certo uma pressão? Como se reconhece? No contexto político-mediático português, a palavra tem vindo a revelar-se deslumbrantemente polissémica. (...) O interpor de um processo judicial é denunciado como pressão. E uma conversa entre colegas magistrados do Ministério Público durante um almoço pode - a atender ao que se noticiou esta semana - surgir como pressão, com direito a dramática denúncia pública mais pedido de audiência ao Presidente da República.
Entendamo-nos: ou tudo e qualquer coisa pode ser uma pressão, tipo "o meu patrão pressionou-me para eu trabalhar mais", ou pressão é sinónimo de uma interferência que tenta condicionar abusivamente, com recurso a uma ameaça ilegítima. Se o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público denuncia a existência de pressões sobre os procuradores do caso Freeport que implicariam nem mais nem menos que a intervenção do Presidente, das duas uma: ou as pressões existem e nesse caso só se percebe que não tenham sido directamente comunicadas, como seria normal, à hierarquia da magistratura - o Procurador Geral - porque o Sindicato considera que este não está em condições de as investigar e dirimir (o que implica a desautorização e insinuação do comprometimento de Pinto Monteiro); ou trata-se de mais do mesmo, ou seja, uma acção tendente a adensar o clima de suspeição e alarme que rodeia o processo. (...)

"(Fernanda Câncio, no Diário de Notícias)


2. "(...) Marinho e Pinto, actual bastonário da Ordem dos Advogados, não é um português comum. Não fala em surdina, não se fica pelas meias tintas, não é conveniente. Diz o que pensa com uma veemência invulgar numa cultura de pudicícia e tibieza. É daquelas pessoas que estragam o ambiente de qualquer festa. E, no entanto, ninguém como ele tem defendido os portugueses dos abusos da justiça e dos processos ilegais de investigação. De facto, Marinho e Pinto tem sido o verdadeiro provedor de justiça em Portugal.
Os seus argumentos são objectivos. As polícias, magistrados e juízes não podem, em momento algum, cometer ilegalidades. Não é admissível que se realizem escutas sem autorização, se torturem presos ou se adulterem elementos de prova. Não é legítimo que se façam buscas sem razões muito bem fundamentadas; que se coloquem primeiro as pessoas em prisão preventiva para depois investigar; que se manipule sistematicamente a opinião pública com fugas de informação selectivas.
Neste ponto, tão determinante num tempo de circo mediático, Marinho e Pinto tem alertado para a crescente promiscuidade entre jornalistas e polícias, raras vezes para efeitos de esclarecimento da investigação e quase sempre com vista à manipulação da opinião pública. As fugas de informação de um processo em investigação só podem partir de dois lados, ou da polícia que investiga ou do Ministério Público que conduz a investigação. E, no entanto, praticamente todos os dias aparecem cópias de documentos que estão em segredo de justiça sem que aparentemente ninguém se interrogue como é isso possível. Esta realidade, escandalosa e particularmente grave em qualquer sítio civilizado, tem sido vista por cá como uma espécie de tradição. Erro grosseiro, já que o facto de existirem na polícia e/ou no Ministério Público pessoas que sistematicamente cometem graves ilegalidades só para favorecer determinadas perspectivas da investigação, ou ainda pior, determinados interesses privados ou políticos, é a efectiva origem das balbúrdias constantes em que a justiça no nosso país mergulhou. Acabe-se com as fugas e tudo acalma.
Elas não acabam contudo porque para além da motivação conjuntural ou mesquinha, existe um objectivo superior. Trata-se de transferir os julgamentos dos tribunais para a chamada praça pública. Incapazes de acusar com provas, certos polícias e certos magistrados colaboram activamente no linchamento mediático das pessoas. E uma vez desencadeado esse procedimento medieval ninguém escapa à condenação. São já demasiado os casos em que esses linchamentos resultaram nos tribunais em absolvição por declarada inocência ou falta de provas. Não é aceitável.
Marinho e Pinto tem denunciado tudo isto, visando sobretudo e naturalmente aqueles que deviam ser os primeiros a não permitir tais comportamentos. (...)"

(Leonel Moura, no Jornal de Negócios)

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